notas suicidas



SUPLÍCIO
Acordar
As manhãs
................
 Almoçar
As tardes
................
Jantar
As noites
................
Dormir
‘dormir, dormir... talvez sonhar...’
Morrer!
........
Porém   
‘tenho em mim todos os sonhos do mundo’


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E era então somente eu... era dor era loucura

                                                                ARRITMIA

Aspirando obsessivamente ser algo

Algo que nunca poderia ser

Seu ‘Angel in the snow”

E me perguntando para quê continuar

Sabendo que essa tempestade nunca vai passar


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ao longo de minha vida 
cometi muitos suicídios
mas, sinto, que o próximo
será também o último

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minha vida seria tão fácil
se ao invés de mim,
fosse outra pessoa a vivê-la


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assim será sempre
nunca vou conseguir 
"traçar meu caminho estoico"
estarei sempre enredada nas dores físicas
e, principalmente, nas litanias metafísicas
sempre
não há possibilidade de vida

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os dias têm sido tão estranhos
voláteis
velozes
do jeito que vago
desolada
não faço nada
respirando, comendo, dormindo
nada além
não penso
nada crio
nada mudo
apenas vou
sinto que é o fim
sei que são meus últimos dias
acabou
algo em mim desistiu
algo se quebrou definitivamente
não tenho mais emoções
não me importo mais
a vida se foi de mim
o amor
a paixão
o desejo
o trabalho
estou só
sempre
sozinha ou com alguém
estou só
estou ausente de mim mesma
nada espero mais
tudo se passou tão rapidamente
e eu…
eu perdi os sonhos
perdi a hora
o entusiasmo me abandonou
tudo se foi
acabou
os gestos se congelaram
os olhares se desfocaram
nada sobrou
por isso me apago
por isso morro agora
porque já morri há tempos
corpo sem alma
e eu caí, estou caindo
esta noite
desapareço
esqueço, enfim.

… e nenhum vestígio.



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NADA
NENHUMA
 "promessa de vida no meu coração"
NENHUMA
NADA



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vazio
abraço o vazio
sou abraçada pelo vazio
e assim ondulamos e flutuamos no nada giratório da morte


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senti que tinha chegado o momento tão esperado, tão temido
pensei que fosse ser o auge de um terrível desespero,
de uma insuportável dor,
mas não, estou serena
a ponto de escrever esta nota sem um mínimo de remorso
agora, simplesmente deitar sob essa noite de lua
sentindo passar sobre mim uma brisa suave
ouvindo Elliott Smith
e esperar...





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e aquela sensação de falência...
e aquela certeza de que não vai dar...
não vai dar
não vai dar
acabou
tudo se desaba
tudo se impossibilita
e eu?  e eu?
soterrada pelo desastre que sou


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sempre essa impossibilidade 
de suportar cada minuto,
sempre  esse olhar doente, 
de uma perspectiva empobrecida
de uma incapacidade de criar possibilidades
de só poder ver o abismo... o terror... a morte... 
de sentir-se sempre em queda
caindo... caindo... caindo...
caindo indefinidamente
é estar sempre entre limites intransponíveis
estar incomunicável
tudo se torna inviável
então um estilete
o corte
o sangue
a água
desaparecer........

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prisioneira das noites
dessas intermináveis noites
indigna da vida
tudo quer durar, proliferar
a mim só atrai o fim
estagnada e incapaz de gerir os dias
incapaz de contatos
incapaz de prazer
só disponível ao mau humor, à tristeza
será sempre assim, essa torpe infelicidade
sufocante, insuportável
absolutamente intolerável
enfraquecida, indisposta
entorpecida por uma espécie de névoa
perdida
será isso um cântico à dor?
será isso o que acredito que seja
o gemido de alguém impotente
buscando mil motivos para não tentar
para não se mover
permanecer parada equivocada e distante
sempre sempre sempre
o corte e a morte
disso pelo menos serei capaz?
não acredito nem mesmo nisso
voilà, vejamos...

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Tive a certeza ontem de que é impossível continuar
simplesmente sei agora
percebi a irremediável ruína
por mais que tente escapar
por mais voltas que eu dê
sigo uma linha que se embaralha
sou arrastado por um desatino
insanidade
é como ultrapassar um certo ponto
exagerar num elemento
é como uma mania talvez
estar prisioneiro de uma repetição
esfarelado num hiato que é sempre o mesmo
de novo e de novo e de novo
fixação
obssessão
está mais próximo do desespero,
da fúria
que da loucura
um desespero avassalador
impossível de conter
que não cabe no peito
que cega, que alucina
que faz gemer, 
contorcer-se,
bater-se, 
mutilar-se
lançar-se das alturas

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Planos. Faz planos quem acredita que vai continuar vivendo. 
Quem quer continuar vivendo.
Quem acredita na vida, nas pessoas.
Está fora. Definitivamente fora. 
Quem não tem absolutamente nada. 
Nem vontade nem paixão.
Para estes não há vida. Portanto, não há porque nem como fazer planos.
A única estratégia a ser traçada é a de sua própria morte. 
Como morrer?!? é a pergunta
Como morrer?!? Godard diz que na Suíça há pessoas que ajudam os que querem
morrer a morrer. 
Aqui não é Suíça. É Brasil. Aqui não há possibilidade de
vida nem mesmo de morte. 
Terei que encontrar e executar minha própria alternativa de morte.
A veia azul se apresenta vívida e volumosa. 
Escreverei a palavra morte no
braço com um caco de vidro. 
M no centro interno do antebraço, depois O, R, T,
e quando for escrever o E estarei bem em cima da veia azul. 
Ao traçar essa última letra saltará um borbulho de um vermelho escuro.
A veia azul tornar-se-á um corte vermelho.
Morro ouvindo o Réquiem de Mozart. E é só.
Agora só resta esperar. 
Nenhum plano. Este, talvez, seja o único plano de minha vida.


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estou congelada numa mortífera repetição
num buraco em que só passa a mesma cena o tempo todo
estou como que tomada por uma febre que me põe a tremer
tremer em movimentos convulsivos, repetitivos
deve ser já o efeito do veneno
dose suicida


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gritei gritei gritei
ninguém ouviu
chorei chorei chorei
ninguém se importou
não sei...
mas, por que ouviriam?
por que se importariam?
tenho estado ausente,
tenho me cercado por abismos
sou um deserto
por que alguém acharia que falo sério?
que estou desesperada?
que não aguento mais?
quando encontrarem meu corpo,
talvez amanhã? depois de amanhã?
ou sabe-se lá quando
então saberão

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estarei azul
numa explosão magnífica, o coração espalhará sangue
sangue que arroxeará a pele
inchará a carne
lábios azuis
unhas negras
um tom violáceo pelas faces
morrer em meio a um estouro de luz
que se abre em leque de cores vibrantes
tombar atingida pela forte dor aguda
tudo entra em convulsão
uma rebelião de sangue e órgãos que se misturam
nervos que se contorsem em movimentos desordenados
estarei azul
cianureto de potássio é o que trago em meu aperitivo

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Quem há de vir me salvar?
Haverá anjos?
Quem pode arrancar-me
A pele pútrida?
Quem se importará
Quando ao amanhecer
Eu tiver partido?
O que importa isso, afinal?
E eu mesmo repugno minha  existência.


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Não tenho voz
Sou um fantasma
Que vive a proclamar
Coisas que só eu escuto
O silêncio se prolonga
Cheio de gritos
Gasnares
Rangidos
A noite é longa
No interminável
Termino eu.

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Back again
De volta
O espectro
A sombra
De volta
A certeza da falência
A certeza do nada
A insuportável tristeza
A sensação da inutilidade de tudo
Do vazio das coisas
De não poder mais
De não poder mais
De não poder mais
De volta
O vislumbre do fim
A impossibilidade de acreditar


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não é sem uma dor profunda que escrevo agora, não é sem chorar e me sentir muito triste, mas é o que sinto, algo me compele a agir assim, algo torna simplesmente insuportável toda essa situação, algo me impede de agir de outro modo. todo dia se repete e repete a mesma impossibilidade, eu um verme a se contorcer infinitamente, repetidamente, sinto como se estive soterrada, terrivelmente me debatendo sozinha numa batalha já perdida.

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Não conseguir acreditar
No mundo nas coisas em si
I can’t
triste entardecer
É tarde
Sinto a insuficiência do tempo
É tarde
Sinto a inexistência do tempo
É tarde
Impossível continuar
sorrisos perdidos
Canções que nunca serão tocadas
Poesias que nunca serão lidas
Imagens que nunca serão vistas
Mundos que nunca serão experimentados
De volta
A sombra
Que não se revela
O desejo
Que não vem à tona
O céu afunda
E eu também.


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Acabo de constatar algo que não poderia ser para mim a mais terrível das realidades.
Tudo foi em vão. Vão. Vão.
Todos esses anos… tudo por nada. O que resulta de todas essas coisas. Nada. Não fiz nada.
Como sou absurdo!!! Meu deus que constatação! Isso desaba sobre mim e é um desastre.
Será que é mais uma manifestação da minha incapacidade de apreciar o momento de entender com a alma e o corpo que só existe o momento? mas, agora... agora não dá mais tempo.

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i want to sleep and sleep and sleep and sleep...
(without dreams, please)
i don't want to wake up, only to sleeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeeep.
there is a beautiful moon outside,
but i am blind now
there is a sweet song playing
but i am deaf now
there is a fresh fragrance in the air
but i can't breath now
i am frozen 
oh, night of my days
icy darkness
am i dead?